por Cyro Saadeh*
Muitas pessoas assistem filmes de ação e espionagem, como os do 007, e imaginam que isso só ocorra lá fora, com o Mossad israelense, a CIA estadunidense, o francês Segurança Exterior, o britânico MI5, o Serviço Federal de Segurança russo...
O Brasil também tem um serviço de espionagem, chamado ABIN - Agência Brasileira de Inteligência. Mas a história da espionagem brasileira remonta aos anos 20 do século passado, ou seja, há mais de 80 anos, com o Conselho de Defesa Nacional, criado pelo então presidente da República Velha, Washington Luis, em 1927. Posteriormente, o presidente Dutra substituiu esse serviço pelo Serviço Federal de Informações e Contra-Informações - SFICI, ligado ao Conselho de Segurança Nacional.
No auge da guerra-fria, nos fins dos anos 1950, com a divisão do mundo em dois blocos, o comunista, liderado pela União Soviética, e o capitalista, capitaneado pelos Estados Unidos, o serviço secreto brasileiro passou a repassar informações a vários países do bloco ocidental.
Com o golpe militar em 1964, substituiu-se o anterior serviço secreto pelo SNI - Serviço Nacional de Informações, a quem incumbiria coordenar as atividades de informações e contra-informações relativas à Segurança Nacional. Houve a incorporação de todos os antigos funcionários, civis e militares do extinto órgão. E no auge da repressão da ditadura militar brasileira foi criada a Escola Nacional de Informações, a EsNI e o Sistema Nacional de Informações - SISNI, que era coordenado pelo SNI e composto por diversos organismos do Executivo, atuarquias e empresas públicas, inclusive. Os agentes não confirmam, mas é certo que o setor de informações brasileiro repassou inúmeros dados confidenciais aos governos ditatoriais da Argentina, Chile e Uruguai durante o áspero tempo da operação Condor. Dizem, até, que o ex-presidente João Goulart foi assassinado no Uruguai por conta da troca de informações entre os serviços secretos daquele país e o Brasil. De qualquer modo, foi uma época que ninguém sente ou deveria sentir saudades.
Ao contrário dos militares, o presidente deposto João Goulart não investiu no órgão de informações existente e por isso não teve condições de evitar o golpe a tempo. Numa breve análise passada pelos militares fiéis ao governo eleito, concluiu que não teria condições de resistir ao golpe, o que o fez optar por deixar Brasília e determinar que não houvesse resistência. Tudo para evitar o derramamento de sangue.
Em 1989, com a promulgação da Constituição Cidadã, com o fim da ditadura militar e o governo civil de José Sarney (transição democrática), as informações passaram a ser voltadas à produção do conhecimento e as contra-informações à salvaguarda do conhecimento. O SNI voltou-se à defesa dos objetivos do Brasil no cenário internacional e de salvaguarda dos interesses do Estado contra as ações terroristas, de sabotagem ou espionagem.
O primeiro presidente eleito pós-golpe de 1964, Fernando Collor de Melo, extinguiu o SNI e criou a SAE - Secretaria de Assuntos Estratégicos, em 1990. Com a posse do vice Itamar Franco, em 1992, houve uma reestruturação administrativa e criou-se a SSI - Subsecretaria de Inteligência.
Com o fim da guerra fria, os serviços de inteligência passaram a combater o crime organizado, o terrorismo, o narcotráfico, a biopirataria, a espionagem industrial e os crimes transnacionais. E em 1997 era criada a ABIN- Agência Brasileira de Inteligência, que em 1999 passou a assessorar diretamente a presidência da República e como órgão central do Sisbin - Sistema Brasileiro de Inteligência, composto por todos os órgãos de inteligência do país, sejam militares ou policiais.
Hoje virou moda falar em serviços de inteligência. Todas as polícias têm o seu serviço de inteligência, a Receita Federal e muitas Secretarias Municipais e Estaduais Fazendárias também o têm. Outros órgãos públicos, os mais diversos, também já o criaram. Há até grandes empresas privadas e de economia mista que possuem núcleos que podem ser chamados de inteligência. Na verdade, os especialistas preferem chamar essas atividades de centros de informações, já que a inteligência propriamente dita é destinada não só a quem detém informações, mas ao organismo ou setor que pode, ao mesmo tempo em que conhece os fatos, analisá-los e tomar decisões imediatas para salvaguardar interesses vitais.
Hoje, a ABIN visa assessorar o Presidente nas questões de interesse do Estado e proteger assuntos sigilosos relativos aos interesses do Estado e da sociedade. Para isso, a agência pode, inclusive, firmar convênios com os serviços de espionagem de outros países. Há poucos anos, na época do PAN de 2007, criticou-se a ABIN por manter contatos próximos com a espionagem cubana.
Tema polêmico é a disposição da ABIN de fazer escutas e interceptar dados, quando houver suspeitas de terrorismo ou sabotagem, independentemente de autorização de juiz de direito. Hoje, a Constituição Federal exige prévia autorização judicial para qualquer modalidade de escuta ou de interceptação de dados. Embora haja projeto legislativo prevendo esses poderes ao nosso serviço de inteligência, a aprovação dessa permissão ainda depende de aprovação do Congresso Nacional.
Hoje, a ABIN pode ser conhecida um pouco melhor até pela internet http://www.abin.gov.br/. O atual dirigente da ABIN é um civil, ex-delegado federal e ex-superintendente nacional da Polícia Federal.
O serviço que antes assustou muitos brasileiros devotados durante os perversos tempos de uma ditadura não tão distante, hoje tenta se aproximar das pessoas com necessidades especiais e até das crianças, através da criação de personagens infantis. Isso não apaga o passado negro, mas é sinal de que a condução e os objetivos são outros, observando o respeito à cidadania e às diferenças que não afastam, mas que formam uma brasilidade necessariamente tolerante.
E se você curte aventuras e todo o estresse por detrás da atividade de inteligência e também domina outro idioma, pode arriscar a prestar concurso para ser um agente da ABIN. O concurso está agendado ainda para 2008. É, mas não se esqueça de que glamour e mulheres maravilhosas só há nos filmes. A vida real é bem mais dura e também mais humana, ainda bem. A cidadania agradece.
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* jornalista (a foto foi extraída da página oficial da agência)